top of page
kYWk8TW5TkpCWkB0mkUm72N0lb8.jpg

O MUNDO FEITO DE LUZ E SOMBRA

Crítica de Exhuma

por Ieda Lagos

26.06.2024, 10h30

Logo no começo do filme somos recebidos pelo voice over de Lee Hwa-duk, uma  das protagonistas que conta ser coreana. Isso pode soar trivial, apenas parte de um  contexto, mas todo o filme faz questão de explorar essa base através da cultura e da  história, e nem a narrativa nem a direção permitem que seus espectadores possam  esquecer de onde se fala. 

Esse é o terceiro longa-metragem da carreira do diretor Jang Jae-hyun e ele  apresenta uma maturidade interessante ao se pensar no cinema de horror coreano,  demonstra um estudo a cerca de modelo e da própria cultura para chegar nesse projeto  com um conjunto de ideias que criam uma obra de camadas.  

Em seu primeiro ato somos apresentados a dois Xamãs, um especialista em feng  shui e um mortuário, que se conhecem trabalhando em casos paranormais e se juntam  novamente para trabalhar em um novo caso relacionado a uma família extremamente  rica. Nesse ato existe uma construção de personagens que se assemelha a um modelo  de começo de filmes de super heróis, dando uma personalidade quase caricata para cada  um o que nos permite ao longo do filme ir supondo alguns movimentos e decisões, e por  vezes até mesmo usando essa premissa como quebra de expectativa.  

Nesse ato as bases estruturais narrativas do cinema de terror paranormal seguem  aos modelos de fácil reconhecimento, ou seja, já estamos preparados para o pior. Os  quatro se juntam no caso tentando salvar o bebê da família que parece adoecer através  de algo paranormal relacionado ao seu bisavô. É necessário que se exume o caixão do  antigo patriarca para acabar com um possível maldição, mas tudo no local é sinistro o  suficiente para criar uma tensão crescente, mesmo a insegurança do especialista em feng  shui que prova a terra, observa os animais, e analisa o local com atenção para chegar  nessa conclusão.  

Mesmo seguindo modelos de fácil acesso é através da pesquisa ritualística e  cultural que o diretor demonstra suas habilidades. Não existe margem para a dúvida, o  filme trabalha com a crença no paranormal, sendo uma obra que pouco se apoia em  jumpscare, mas foca nas ações ritualísticas e na tensão crescente através das decisões  dos quatro especialistas que são representantes de uma cultura tradicional coreana.

bsW1Qc5s931AqZQtn22U7FCqjcY.jpg

O caixão então é exumado, mas não se pode cremar em dia de chuva segundo as  crenças as quais o filme segue, o caixão não pode ser aberto de forma alguma e é  exatamente por isso que alguém irá abri-lo em busca de tesouros. Luta-se então contra  esse patriarca que teve seu espírito preso por quase cem anos no caixão, e que vai atrás  de sua linhagem, basta apenas queimar o corpo para livrar desse espírito. As regras vão  sendo explicadas ao longo do filme, e não de uma forma processual, mas através das  situações que vão se apresentando.  

No segundo ato, mesmo que já se tenha vencido ao primeiro espírito, algo naquela  terra onde o homem estava enterrado ainda não parece normal. Os quatro então voltar  até o local onde Kim Sang-duk, o especialista em Feng shui encontrou mais um caixão.  

Nesse momento tudo indica perigo, o caixão na vertical enrolado em arame  farpado e escondido abaixo de primeiro caixão, mas mesmo assim eles decidem tirá-lo da  terra e o que estava ali ajuda a ilustrar o trauma da Coreia do Sul em relação ao  imperialismo japonês, e toma a decisão de falar do paranormal como um horror profundo  criado pela perversidade humana, especialmente ligada à um histórico cultural de dor e  violência, em que a criatura que dali sai é um general que chegou a matar dez mil  pessoas, se tornando uma entidade.  

m8k1rFB68IZmIUoJfpnboY4taVg.jpg

Nesse segundo ato o suspense perde espaço e o terror se torna visual e  sangrento, os que ainda lutam precisam de um plano para distruir a criatura libertada, e  nesse momento o filme tenta amarrar as duas tramas. Infelizmente, para mim essa  transição entre as duas histórias ficou pouco clara, o trabalho do segundo ato é bem mais  complexo que no primeiro, precisando pincelar o histórico entre Coreia e Japão,  expandindo o folclore tradicional coreano através de uma iconografia que se mistura com  o imaginário Budista em um processo narrativo para resolver tanto a luta contra as  sombras que seguem dominando a terra, quanto a sobrevivência daqueles que o  infernam.  

Nessa tentativa de colocar muito, o segundo ato perde força, o que não muda a  minha opinião em relação ao quão interessante essa base de referências foi para essa  trama de terror, especialmente pensando no quão pouco o ocidente tem acesso ao  tradicionalismo de países asiáticos.  

Os personagens do começo se mantém íntegros aquilo que nos foi apresentado, e  me faz ter vontade de ver novos episódios de batalhas paranormais com os mesmos,  assim como as particularidades com que o ritualismo tradicional coreano são utilizados. 

Ao final o mundo é feito de luz e sombras, e as disputas no cinema de terror são,  em seu núcleo, as mesmas, o que não significa que a forma com que se luta contra elas  seja a necessariamente sempre a mesma. 

cartaz_exhuma.jpg
4_estrelas.png

Exhuma

2024 Mistério/Horror/Thriller

DIREÇÃO: Jang Jae-hyun

ROTEIRO: Jang Jae-hyun

ELENCO: Choi Min-sik, Kim Go-eun, Yoo Hai-jin, Lee Do-hyun

bottom of page